Sunday, April 21, 2013

A PRIVATIZAÇÃO DA CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS

A possibilidade de privatização da Caixa Geral de Depósitos (CGD) deve ser discutida «sem tabus», mas uma venda parcial «dificilmente corria bem», disse o antigo presidente da Associação Portuguesa de Bancos João Salgueiro.

«Há que não haver tabus nisto. É para discutir, discuta-se. Agora, os argumentos que tenho ouvido [a favor da privatização] são desastrosos», disse Salgueiro, que já presidiu à CGD, numa entrevista à Lusa.
«Ouvi dizer, tive até de ler três vezes, que era bom ter lá interesses privados para controlar a governamentalização excessiva. Isto não percebo! Nunca ouvi falar em ter interesses privados para controlar a qualidade da vida política. E se há necessidade de controlar a governamentalização, a Constituição tem mecanismos para isso», afirma.
A possibilidade de privatização parcial «é uma coisa muito difícil que corra bem», porque «haverá interesses privados que não serão do interesse do accionista maioritário». Salgueiro recorda o caso do Banco do Fomento, onde se experimentou um modelo semelhante, e «os bancos privados accionistas tinham uma estratégia diferente da que o banco devia ter».
Salgueiro também pensa que «estar a vender nesta altura não é grande ideia», porque a CGD «deve valer muito menos do que valia, para aí um quinto ou um sexto».
De qualquer forma, o conceito de o Estado ter um banco não repugna Salgueiro: «Praticamente todos os países europeus o têm».
Na entrevista com a Lusa, Salgueiro abordou ainda outros temas:
BPN: Reguladores deviam ter feito mais
A falência do BPN é um exemplo «notório» de má gestão que «as autoridades não viram a tempo», afirma João Salgueiro.
«Muita gente falou com os reguladores sobre» a situação no BPN, disse Salgueiro. Os responsáveis pela supervisão bancária, mesmo sem terem «poderes de investigação policial, podiam ter pedido ao Ministério Público» para investigar.
«Houve pouca desconfiança quanto ao que se estava a passar no BPN», conclui.
Ajuda externa: Sair do euro «não é uma escolha, pode ser uma fatalidade»
João Salgueiro reconhece que a saída do euro «é uma alternativa» às políticas actuais – mas, se a actual via «é má», abandonar o euro «era pior».
«Acho que [sair do euro] não é uma escolha. Poderá ser uma fatalidade», afirmou. «A queda do nível de vida seria o dobro do que está a acontecer».
«Pode-se discutir essa alternativa, mas é daquelas que ninguém aconselha», prossegue Salgueiro. «As pessoas perderiam poder de compra, não podiam andar de automóvel, não podiam comer o que queriam».
Ao fim de alguns anos, a competitividade do país até poderia melhorar através do efeito da desvalorização cambial, mas com grandes custos, pensa Salgueiro: «Não creio que seja isso que os portugueses querem».
Austeridade: «Grande parte» dos ministros não tem «experiência de governo» nem de gestão
Pedro Passos Coelho escolheu para o seu Governo «pessoas que conhecia», e «salta à vista que grande parte [dos ministros] não tem experiência de governo», pensa João Salgueiro.
Além disso, com excepção de «duas ou três pessoas», a experiência de gestão dos ministros «é limitada, só de empresas pequenas ou médias».
No entanto, acrescenta Salgueiro, «ninguém está interessado em que o Governo caia»: «Nem a oposição, nem o Presidente da Republica, nem a União Europeia, nem o Fundo Monetário Internacional».
Isso porque a actual situação do país é «complicada», e todas estas instituições preferem que «sejam outros a tirar as castanhas do lume».
Ajuda externa: «Devíamos ter pedido ajuda seis meses antes»
O pedido de ajuda financeira à ‘troika’ devia ter sido feito «seis meses antes», considera João Salgueiro.
O pedido, feito em Maio de 2011, «podia ter sido negociado melhor, como fez a Irlanda». Portugal negociou «já em estado de necessidade».
Salgueiro acha que «o país não teve dúvidas de que o governo do engenheiro [José] Sócrates só pediu ajuda quando estava mesmo falido».
Sócrates «aguentou o mais que pôde, com alguma imaginação até», continua o antigo ministro das Finanças, dando como exemplo as parcerias público-privadas, que permitiram «continuar a gastar dinheiro mas deixando a conta para pagar depois».
Lusa/SOL

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