Guerrilheiro das FP-25 mata inspector da PJ
O inspector António Coutinho tem um merecido lugar de honra na história da Polícia Judiciária: chefiou com êxito a luta contra as Forças Populares 25 de Abril (FP-25), a organização terrorista liderada por Otelo Saraiva de Carvalho.
No Verão de 1987, após diversas operações policiais, uma centena de implicados nas FP--25 aguardavam na prisão a conclusão dos processos judiciais. Mas pelo menos uma dezena de operacionais estavam a monte – entre eles, Alberto Teixeira de Carvalho e António Manuel Baptista Dias.
As FP-25, embora desmembradas, continuaram a levar a cabo alguns assaltos a bancos e ainda lhes restava alguma capacidade para atentados. As brigadas da Direcção Central de Combate ao Banditismo (DCCB), o departamento da PJ encarregado de lhes dar caça, não paravam desde Junho de 1984 – quando foi lançada a “Operação Orion”, a primeira grande acção contra a organização terrorista.
No Verão de 1987, ao fim de três anos intensos, a sede da DCCB, na Avenida José Malhoa, ainda fervilhava de actividade: os investigadores trabalhavam pelos fins-de-semana e sem horários. Equipas da PJ mantinham sob discreta vigilância as visitas aos reclusos das Forças Populares 25 de Abril.
As atenções da polícia, a partir de certa altura, voltam-se para uma mulher, Angélica Torquito, que visitava regularmente o marido, Jorge Manuel Alves da Silva, no Estabelecimento Prisional de Lisboa: ele pertencia à organização; ela servia de correio entre reclusos e operacionais na clandestinidade.
Num escaldante domingo de Agosto, dia 16, Angélica, como habitualmente fazia, foi visitar o marido. Estava grávida da filha Sara, que havia de nascer na cadeia, e deixara em casa o filho, Paulo, então com 10 anos. Mal sabia que aquele dia não seria como os outros. Inspectores da DCCB aguardavam-na, sem ela os ver, à saída da penitenciária, na Rua Marquês da Fronteira, ao cimo do Parque Eduardo VII.
A brigada da DCCB estava dividida por dois carros – e um inspector seguia numa moto todo-o-terreno. Angélica, sem saber, levou os polícias à Praça do Areeiro, onde dois homens, pelas cinco da tarde, a esperavam com impaciência num BMW. Eles eram Alberto Teixeira de Carvalho e António Baptista Dias – ambos operacionais das Forças Populares 25 de Abril e considerados como perigosos.
Alberto era procurado há coisa de dez anos, ainda do tempo das Brigadas Revolucionárias (BR) – uma organização de acção directa fundada por Carlos Antunes e Isabel do Carmo, em 1970, com o objectivo de derrubar a ditadura. Mas as BR voltaram a mergulhar na clandestinidade em finais de 1975: levaram então a cabo vários assaltos a bancos – até que, em 1979, sofreu rude golpe da Polícia Judiciária. Alberto Teixeira de Carvalho escapou à vaga de prisões e, como muitos operacionais das Brigadas Revolucionárias, foi fundador das FP-25.
O outro, António Manuel Baptista Dias, professor do ensino básico, era perseguido há pouco menos de dois anos: já tinha sido preso – mas fez parte do grupo de dez reclusos das FP-25 evadidos, em Setembro de 1985, do estabelecimento Prisional de Lisboa.
Angélica Torquito olha à volta, nervosa, e reconhece o carro que a aguarda. Teixeira de Carvalho está ao volante, António Dias ocupa o outro banco da frente. Ela entra no carro – que arranca pela Avenida Almirante Gago Coutinho.
Os polícias sabem que os dois suspeitos não hesitariam em responder a tiro – como, de resto, acabou por acontecer. O BMW, já na rotunda do aeroporto, toma a Avenida Marechal Gomes da Costa. Alberto Teixeira de Carvalho e António Baptista Dias, desconfiados como animais acossados, pressentem que estão a ser seguidos: cheira-lhes a Polícia e aceleram. Os perseguidores fazem fogo. Angélica Torquito deita-se no banco de trás para se proteger dos tiros. O BMW dos fugitivos, com pneus furados e vidros partidos, continua avenida abaixo, em direcção ao rio.
Numa antiga rotunda (hoje, o cruzamento para o Parque das Nações) um carro da PJ ultrapassa-o e barra-lhe o caminho. Estala então intenso tiroteio. O inspector Álvaro Militão, de 32 anos, é atingido por uma bala de calibre 7,65 mm que lhe dilacera um pulmão: morre ao fim de escassos minutos de agonia. Outro polícia, António da Silva Luís, ficou ferido. Teixeira de Carvalho e Baptista Dias renderam-se. Angélica, que se esgueirara durante a troca de tiros, ferida por estilhaços de vidros partidos,conseguiu chegar a pé aos bombeiros do Beato – que a transportam ao Hospital de S.José, onde é presa horas depois.
JULGAMENTO PENAS
As FP-25 de Abril fizeram-se anunciar na madrugada de 20 de Abril de 1980 através do rebentamento de petardos em várias cidades do País. Seguiram-se sete anos de violência, assaltos a bancos de que se perde a conta, 18 homicídios a tiro e à bomba e outros tantos tentados. A morte de Álvaro Militão foi o único crime de sangue das FP que terminou com a condenação do autor, Teixeira de Carvalho, num julgamento presidido pelo juiz Ricardo Cardoso.
O arguido, já condenado à revelia por associação terrorista, foi punido em cúmulo jurídico a 20 anos de prisão. Baptista Dias, que também já tinha uma condenação anterior, foi punido por homicídios tentados na pena única de 16 anos. Angélica foi absolvida.
AS TEIAS DA LEI
- O primeiro julgamento das FP começou em Setembro de 1985: 73 réus presentes, entre eles Otelo, e 14 revéis responderam por associação terrorista.
- O julgamento, presidido por Adelino Salvado, terminou em Maio de 1987. Foram condenados 48 réus (Otelo a 15 anos) e absolvidos 16.
- No segundo processo, responderam mais 30 arguidos por associação terrorista.
- Pelos homicídios e roubos foram julgados 64 arguidos (Otelo incluído), em 1999. Não houve condenações, por falta de provas ou porque os crimes prescreveram.
No Verão de 1987, ao fim de três anos intensos, a sede da DCCB, na Avenida José Malhoa, ainda fervilhava de actividade: os investigadores trabalhavam pelos fins-de-semana e sem horários. Equipas da PJ mantinham sob discreta vigilância as visitas aos reclusos das Forças Populares 25 de Abril.
As atenções da polícia, a partir de certa altura, voltam-se para uma mulher, Angélica Torquito, que visitava regularmente o marido, Jorge Manuel Alves da Silva, no Estabelecimento Prisional de Lisboa: ele pertencia à organização; ela servia de correio entre reclusos e operacionais na clandestinidade.
Num escaldante domingo de Agosto, dia 16, Angélica, como habitualmente fazia, foi visitar o marido. Estava grávida da filha Sara, que havia de nascer na cadeia, e deixara em casa o filho, Paulo, então com 10 anos. Mal sabia que aquele dia não seria como os outros. Inspectores da DCCB aguardavam-na, sem ela os ver, à saída da penitenciária, na Rua Marquês da Fronteira, ao cimo do Parque Eduardo VII.
A brigada da DCCB estava dividida por dois carros – e um inspector seguia numa moto todo-o-terreno. Angélica, sem saber, levou os polícias à Praça do Areeiro, onde dois homens, pelas cinco da tarde, a esperavam com impaciência num BMW. Eles eram Alberto Teixeira de Carvalho e António Baptista Dias – ambos operacionais das Forças Populares 25 de Abril e considerados como perigosos.
Alberto era procurado há coisa de dez anos, ainda do tempo das Brigadas Revolucionárias (BR) – uma organização de acção directa fundada por Carlos Antunes e Isabel do Carmo, em 1970, com o objectivo de derrubar a ditadura. Mas as BR voltaram a mergulhar na clandestinidade em finais de 1975: levaram então a cabo vários assaltos a bancos – até que, em 1979, sofreu rude golpe da Polícia Judiciária. Alberto Teixeira de Carvalho escapou à vaga de prisões e, como muitos operacionais das Brigadas Revolucionárias, foi fundador das FP-25.
O outro, António Manuel Baptista Dias, professor do ensino básico, era perseguido há pouco menos de dois anos: já tinha sido preso – mas fez parte do grupo de dez reclusos das FP-25 evadidos, em Setembro de 1985, do estabelecimento Prisional de Lisboa.
Angélica Torquito olha à volta, nervosa, e reconhece o carro que a aguarda. Teixeira de Carvalho está ao volante, António Dias ocupa o outro banco da frente. Ela entra no carro – que arranca pela Avenida Almirante Gago Coutinho.
Os polícias sabem que os dois suspeitos não hesitariam em responder a tiro – como, de resto, acabou por acontecer. O BMW, já na rotunda do aeroporto, toma a Avenida Marechal Gomes da Costa. Alberto Teixeira de Carvalho e António Baptista Dias, desconfiados como animais acossados, pressentem que estão a ser seguidos: cheira-lhes a Polícia e aceleram. Os perseguidores fazem fogo. Angélica Torquito deita-se no banco de trás para se proteger dos tiros. O BMW dos fugitivos, com pneus furados e vidros partidos, continua avenida abaixo, em direcção ao rio.
Numa antiga rotunda (hoje, o cruzamento para o Parque das Nações) um carro da PJ ultrapassa-o e barra-lhe o caminho. Estala então intenso tiroteio. O inspector Álvaro Militão, de 32 anos, é atingido por uma bala de calibre 7,65 mm que lhe dilacera um pulmão: morre ao fim de escassos minutos de agonia. Outro polícia, António da Silva Luís, ficou ferido. Teixeira de Carvalho e Baptista Dias renderam-se. Angélica, que se esgueirara durante a troca de tiros, ferida por estilhaços de vidros partidos,conseguiu chegar a pé aos bombeiros do Beato – que a transportam ao Hospital de S.José, onde é presa horas depois.
JULGAMENTO PENAS
As FP-25 de Abril fizeram-se anunciar na madrugada de 20 de Abril de 1980 através do rebentamento de petardos em várias cidades do País. Seguiram-se sete anos de violência, assaltos a bancos de que se perde a conta, 18 homicídios a tiro e à bomba e outros tantos tentados. A morte de Álvaro Militão foi o único crime de sangue das FP que terminou com a condenação do autor, Teixeira de Carvalho, num julgamento presidido pelo juiz Ricardo Cardoso.
O arguido, já condenado à revelia por associação terrorista, foi punido em cúmulo jurídico a 20 anos de prisão. Baptista Dias, que também já tinha uma condenação anterior, foi punido por homicídios tentados na pena única de 16 anos. Angélica foi absolvida.
AS TEIAS DA LEI
- O primeiro julgamento das FP começou em Setembro de 1985: 73 réus presentes, entre eles Otelo, e 14 revéis responderam por associação terrorista.
- O julgamento, presidido por Adelino Salvado, terminou em Maio de 1987. Foram condenados 48 réus (Otelo a 15 anos) e absolvidos 16.
- No segundo processo, responderam mais 30 arguidos por associação terrorista.
- Pelos homicídios e roubos foram julgados 64 arguidos (Otelo incluído), em 1999. Não houve condenações, por falta de provas ou porque os crimes prescreveram.