Sunday, May 26, 2013

A Finertec [empresa onde Miguel Relvas trabalhava antes de ir para o Governo] é uma sociedade anónima, detida a 100% pelo Banco Fiduciário Internacional (BFI), sediado em Cabo Verde. Este banco é, por sua vez, uma entidade quase desconhecida (aparentemente detida por capitais angolanos). Uma das poucas referências ao BFI, em Portugal, surgiu em tribunal, em pleno julgamento do «caso» BPN, quando o inspector tributário Paulo Jorge Silva, testemunha de acusação, o referiu como sendo um estabelecimento bancário com ligações ao célebre Banco Insular, criado por Oliveira e Costa para «servir os empresários angolanos que queriam meter dinheiro fora de Angola» (…) Um dia depois do «café» com Relvas, no dia 17 de Março, Silva Carvalho encontra-se, num almoço, com Braz Silva, presidente da Finertec e um dos proprietários do BFI (…) Miguel Relvas remete a última mensagem escrita de que há registo neste processo para o telemóvel do ex-espião. Promete encaminhar as coisas (…) Mais tarde, logo a 6 de Junho, um dia após a vitória do PSD nas eleições legislativas, Silva Carvalho tenta obter de Relvas um favor: denuncia-lhe, tratando-o por tu, um alegado plano de Ângelo Correia para nomear para o SIS uma funcionária da secreta cujo marido, por conveniência, seria afastado do serviço para um cargo de relevo num banco português em Angola (…) Este empresário [Braz da Silva], que reside em Luanda foi, recentemente, candidato anunciado à presidência do Sporting. Com Nuno Vasconcellos, seu homólogo da Ongoing, tem uma predilecção: recrutar gestores no mundo da política. O sucessor de Miguel Relvas na Finertec é Marcos Perestrello, deputado do PS. Vasconcellos, recorde-se, tem ao seu serviço Vasco Rato e Agostinho Branquinho, do PSD, Guilherme Dray e Carlos Costa Pina, respectivamente o ex-chefe de gabinete de José Sócrates e o ex-secretário de Estado do Orçamento de Teixeira dos Santos. As duas empresas, Ongoing e Finertec, partilham, ainda, o desejo de prosperar em Angola e no Brasil (…) Este episódio demonstra a influência que o ex-espião [Silva Carvalho] mantinha sobre os agentes do SIED, mesmo após a sua saída para o sector privado. Os seus aliados, espiões bem colocados na estrutura, idolatravam-no e alimentavam a ideia de que, um dia, regressaria como secretário-geral dos serviços secretos ou ministro da Administração Interna. No início de Agosto de 2011, Silva Carvalho pede a Francisco Rodrigues, director de segurança, que o proteja das consequências que pudessem resultar do inquérito interno em curso no SIED. As investigações foram conduzidas por José Luciano Amaral, um amigo de longa data, que lhe enviou várias mensagens de apoio com linguagem maçónica. Amaral disse ao Ministério Público que decidira ouvir o principal suspeito fora das instalações do SIED, e sem testemunhas ou gravador…
Silva Carvalho alimentava os admiradores com mensagens emocionais e poemas inspiradores, como o de Pablo Neruda que decidiu partilhar com um agente: «Se não puderes ser um pinheiro no topo de uma colina, sê um arbusto no vale, mas sê». Garantia aos ex-colegas que nunca se esqueceria deles, e que os homens grandes nunca caem. Resultado: recebeu várias mensagens de espiões saudosos (…) No dia em que recebeu [da Ongoing] o carro de serviço – uma luxuosa carrinha – fez questão de agradecer directamente a Vasconcellos e Rafael Moura, prometendo fazer tudo para os recompensar. A influência de Silva Carvalho sobre o dono da Ongoing era ostensiva. Antes de uma importante reunião de quadros, enviou a Vasconcellos o discurso que este deveria proferir perante os accionistas da empresa. Noutra situação, fez questão de lhe recordar a amizade entre ambos e que fora ele a passar-lhe o malhete – expressão maçónica que significa passagem de testemunho na liderança de uma loja. Carvalho levou para a Ongoing as suas credenciais maçónicas. Um dos seus primeiros êxitos resultou de um pedido ao ex-grão-mestre do GOL, António Reis. A Ongoing pretendia obter uma licença do IGESPAR, instituto público que gere o património, para modificar, «para uso habitacional», o antigo Hotel Braganza, na Rua Vítor Córdon. O projecto de recuperação do imóvel, que é anterior ao terramoto de 1755, tinha recebido parecer negativo do IGESPAR. Silva Carvalho pediu a António Reis que intercedesse junto do secretário de Estado com a tutela, o socialista Elísio Summavielle. Reis assim fez, por e-mail, no dia 1 de Fevereiro de 2011. Frisando que pede os «bons ofícios» do governante «se um pedido (…) for uma prática aceitável à face da lei e do correcto funcionamento dos serviços». Summavielle respondeu, dois dias depois, dizendo que o pedido estava encaminhado. A VISÃO contactou os dois intervenientes neste episódio. António Reis não atendeu o telefone. Summavielle, que foi nomeado pelo actual governo para dirigir o novo Instituto do Património, esclareceu que essa prática, tanto o pedido como o encaminhamento, «é normal».
Mas nem sempre os «pedidos» de Silva Carvalho receberam resposta positiva. No dia 13 de Maio de 2011, o ex-espião manda um sms a Marco António Costa, líder distrital do PSD e seu amigo de longa data. Identifica-se como «Jorge». O actual secretário de Estado da Formação Profissional pergunta qual. A resposta é elucidativa: o mais importante de todos os «jorges», aquele que «tu» não queres nem para ministro, nem para chefe das secretas. O mesmo tipo de ressentimento surge retratado, no processo, numa mensagem enviada para o social-democrata Vasco Rato, o seu colega da Ongoing que lhe apresentou o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho. Aí, Silva Carvalho admite ser difícil de aceitar não ter chegado a uma posição de relevo, com o novo Governo. E agradece os conselhos do amigo.
No dia 4 de Setembro de 2011, já em plena tempestade do caso das «secretas», Silva Carvalho dá início à vingança. No mesmo email, dirigido ao ex-PJ Paulo Félix, o perito informático que levara consigo para a Ongoing, e que tinha orquestrado a campanha de tweetes contra o grupo Impresa, solicita: «para além de um relatório conjunto sobre a Finertec pedia-vos que vissem o que existe em fontes abertas» sobre Francisco Pinto Balsemão. O resultado chegou, uma semana depois.